A 27ª Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, realizada no Egito, entra para história pela criação do fundo de perdas e danos. O acordo é um dos primeiros passos para a justiça climática no mundo. Por meio do fundo os países desenvolvidos irão compensar financeiramente os mais pobres pelas consequências já em curso do aquecimento global.
Outro fato importante na COP 27 foi a presença do governo brasileiro. O retorno do Governo Federal e a presença dos governadores da Amazônia Legal demonstram que o país está disposto a lidar com as questões que envolvem a Amazônia. O novo presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva, propôs, durante sua fala, que a Amazônia seja a sede da COP 30, em 2025.
A persistência e a resistência da sociedade civil brasileira também foram destaques na Conferência. Centenas de organizações participaram da COP com objetivo de acompanhar as discussões e dar visibilidade aos trabalhos realizados, mesmo nesses anos de desmonte da política ambiental no país, e ainda mostrar a importância dos povos tradicionais para conservação da biodiversidade do planeta.
Nossos membros do Instituto Centro de Vida (ICV) participaram da COP27 e nos mantiveram informados sobre todos os acontecimentos por meio de suas redes sociais. Nós, do Observatorio Pantanal, acompanhamos os 13 dias de eventos, e conversamos com a Alice Thuault, diretora executiva do ICV, para saber mais detalhes dessa Conferência histórica.
1 – Como foi a decisão de o ICV participar da COP27? A participação foi estratégica?
O ICV participa da COP há alguns anos, acho que desde 2008. Para nós é estratégico participar da Cúpula do Clima, porque o estado de Mato Grosso tem, a nosso ver, uma importância grande em termos de laboratório. Afinal, têm três biomas, florestas, águas, populações tradicionais e tem esse modelo de ocupação predatório, que tem uma importância chave para o país, que é o agronegócio. Por isso a gente participa, apesar de muitas vezes esses espaços serem um pouco frustrantes na parte de entrega, muito do que se discute tem a ver com o que trabalhamos aqui no Mato Grosso, por isso vale muito dar input e entender como se configura os debates nesses espaços internacionais.
2 – As expectativas foram atendidas na COP27?
Em termos de expectativas é sempre difícil, porque sabemos que não vamos sair de lá com uma decisão que seja de aplicação imediata em Mato Grosso. Por exemplo, esse fundo de perdas e danos, de 100 bilhões de dólares, a gente já sabe que as regras só vão ser definidas no ano que vem e que vai demorar alguns anos para isso ser operacional.
3 – Na sua opinião, a participação do Brasil foi importante nesta COP, por quê?
A participação do Brasil foi bem importante. Temos essa visão que o Governo Federal está de volta nas negociações e o Brasil tem essa reputação de ser um país que ajuda, que facilita o debate, que contribui na negociação. É um país visto como defensor da paz, um país que vai sempre apoiar o terceiro mundo, países em desenvolvimento. Então ele tem um peso importante na negociação, tem peso de uma liderança positiva para fazer evoluir as negociações.
4 – Pela sua percepção do evento, acredita que podemos ter esperança de que mudanças reais acontecerão para minimizar e compensar as mudanças climáticas?
Sobre a esperança de mudanças reais é um pouco complicado. O fato é que estamos caminhando para um aquecimento maior de 2,5 graus, apesar de todo mundo na COP estar defendendo de 1,5. Mas a gente já sabe que está mais para 2,5 ou 2,8 e essa COP pecou bastante na parte de mitigação, não teve grandes anúncios. Apesar de ser uma COP de implementação não teve uma visão operacional de várias coisas que tinha sido anunciada na COP26.
Agora, vale lembrar que qualquer grau a menos é válido. A gente está em uma corrida pra reduzir o máximo, por isso que esses espaços são necessários e de certa forma também impediram de estarmos em uma situação de 3, 4, 5 ou 6 graus. Tem algumas projeções de cientistas mais dramáticas que também estão sendo afastadas. Mas não deixa de ser agora o momento e da gente ter que se colocar em uma postura de urgência, porque hoje em dia falar de uma mudança climática de 2,8 graus é muito forte, significa muitos impactos e consequências direto para as populações e para uma possibilidade de equilíbrio climático.
5 – O Pantanal, assim como todas as áreas úmidas, teve algum destaque para sua conservação pelos serviços ambientais prestados para o planeta?
Eu não acompanhei diretamente a parte de áreas úmidas. Então, não sei dizer precisamente quais as mudanças e passos que foram dados. Mas não me deu a impressão de que houve muitas mudanças! Mas também teve momentos que mostraram a importância do Pantanal, teve a ação de um coletivo sobre a importância de não transformar o Pantanal em deserto e tem uma preocupação muito forte sobre a água e a desertificação. Vale nesse contexto lembrar que o Pantanal está vivendo essa ameaça de perder uma boa parte do seu volume de água.
A conversa com a Alice Thuault, diretora executiva do ICV, encerra aqui. Mas você pode saber muito mais sobre os riscos da crise hídrica no Brasil e a participação das populações tradicionais na COP27 conferindo os vídeos que estão disponíveis no @institutocentrodevida
Foto: Instituto Centro de Vida