Um importante passo para a preservação do Pantanal ocorreu na tarde de ontem (29), quando o Projeto de Lei (PL) 343/2023 foi apresentado e discutido em audiência pública na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS) A proposta foi elaborada pelo Governo do Estado para substituir o Decreto n. 14.273/2015, devido ao crescimento indiscriminado de desmatamento da planície pantaneira. O Executivo suspendeu, em agosto, a emissão de novas licenças para supressão de vegetação nativa até uma nova legislação ser elaborada.
A nova proposta traz importantes avanços, mas ainda há lacunas que devem ser observadas atentamente, segundo os participantes da mesa de audiência. A pesquisadora Débora Calheiros, integrante do Observatorio Pantanal, compôs a mesa, representando o Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc). Ela ressaltou suas preocupações em relação aos recursos hídricos e à preservação das bacias hidrográficas do Pantanal, bem como a falta de um projeto nacional que contemple o Pantanal em sua totalidade, já que a área está intrínseca ao Mato Grosso. Também solicitou que as comunidades tradicionais, pescadores e ribeirinhos fossem consultados. “Ainda é possível fazer isso. Eles são muito importantes para a região, tanto economicamente quanto social, cultural e historicamente”, justificou.
Artur Falcette, Secretário executivo de Meio Ambiente de MS, apresentou a proposta para o público e destacou o processo de construção coletiva do projeto . Ele explicou que as pessoas consultadas durante o processo de elaboração da lei foram indicadas pelo ‘Grupo de Trabalho para Proteção, Conservação e Uso Sustentável do Pantanal Sul-Mato-Grossense’, estabelecido por meio de uma parceria entre o Governo do Estado e o MMA (Ministério do Meio Ambiente).
O Observatorio Pantanal acompanhou as discussões por meio de suas organizações-membros. O Instituto SOS Pantanal, WWF-Brasil e Instituto Homem Pantaneiro participaram das reuniões oficiais e extraoficiais realizadas para elaboração do projeto de lei.
Para Leonardo Gomes, diretor do SOS Pantanal, o PL irá contribuir com a conservação do Pantanal. “Eu entendo que ele ganha conservação mantendo os percentuais e os direitos dos produtores, ao mesmo tempo, direcionando para onde vai essa conservação adicional, que são justamente para as áreas muito críticas e para os corredores de biodiversidade. Da mesma forma, traz segurança jurídica e legalidade e, por fim, formaliza o que cabe ou não no Pantanal. Traz claramente que o Pantanal é lugar de pantaneiro, do turismo, das atividades extrativistas, das comunidades e não cabe a intensificação da agricultura”, declara Gomes.
O projeto de lei proíbe a instalação de pequenas centrais hidrelétricas, carvoarias, monoculturas de eucalipto e de soja. Porém, os dois mil hectares de soja, já existentes, permanecem na planície, sem expansão.
Luís Antônio Freitas de Almeida, promotor de justiça, representante do Ministério Público Estadual de MS, parabenizou pelo esforço e pelo projeto de lei. Mas questionou sobre a manutenção da soja no bioma e os índices de supressão da mata nativa que se mantiveram os mesmos.
“Em relação à monocultura, reconhecemos que foi um avanço a proibição em novas áreas, porém se manterá as áreas já cultivadas. A pergunta é: a monocultura prejudica o bioma? Se sim, não é porque já foi licenciado que vai se permitir a continuidade dessa atividade ou que, pelo menos, se preveja um limite, até o fim da licença, e se proíba de vez essa atividade. Os especialistas devem dizer se prejudica ou não. O que não pode, se prejudicar, é permitir para alguns e não para todos”, explica o representante do MPE.
Novidades do Projeto de Lei
Entre as novidades da proposta está a criação do Fundo Estadual de Desenvolvimento Sustentável do Bioma Pantanal, denominado Fundo Clima Pantanal, que prevê financiamento de Programas de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). “Esse Fundo já nasce com o compromisso do Governo do Estado de aporte inicial entre 40 milhões e 50 milhões de reais através da reorganização de outros incentivos fiscais”, informou o secretário-executivo de Meio Ambiente do Estado, Artur Falcette.
Prevê também a priorização de áreas de preservação permanente de nascentes e recarga de aquíferos que permitam a formação de corredores ecológicos. Para a concessão de autorizações ambientais destinadas à supressão vegetal ou à conversão de pastagens nativas devem ser comprovadas, considerado condições prévias, entre elas que o imóvel rural esteja regularmente inscrito e aprovado no CAR-MS (Cadastro Ambiental Rural de Mato Grosso do Sul), que não tenha registrado infração administrativa, entre outras exigências. Também prevê a promoção da restauração de áreas degradadas, por meio de incentivos fiscais, financeiros e de créditos, além do fomento à certificação ambiental de atividades e à rastreabilidade das cadeias produtivas sustentáveis desenvolvidas na área.
Próximos passos
Segundo o deputado Renato Câmara, presidente da Comissão Permanente de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia de MS, todas as contribuições recebidas na audiência pública serão consideradas pela ALEMS na tramitação da proposta. “Com as informações apresentadas nesta audiência pública, nós, deputados, vamos nos reunir para debater, discutir, avaliar, ponderar, para podermos encontrar um caminho que seja o mais próximo possível de um ponto de equilíbrio”, disse. O projeto de lei deve ser votado antes do recesso parlamentar e entrará em vigor após 60 dias da sua publicação.
Fotos: Wagner Oliveira e Guto Akasaki